MÃE É QUEM CRIA? (Inspirado no Filme LION)
- Greice Machado
- 8 de jun. de 2018
- 3 min de leitura
Atualizado: 7 de jan. de 2020

Quantas vezes já ouvimos frases como “Fazer filho é fácil.”
“Ser mãe não é só fazer filho”.
“Pai e mãe é quem cria.”
Tentemos pensar sobre isto agora despidos de nossos julgamentos, olhando apenas para os fatos da vida e da existência.
O que torna alguém pai ou mãe? Conceber um filho.
O mais comum é que aqueles que concebem também dão muito mais. Normalmente os pais não somente passam a vida a seus filhos. Eles também os sustentam como podem, cuidam, passam noites em claro quando adoecem, etc.
Mas e quando os pais não estão disponíveis para cuidar de seus filhos? Eles deixam de ser os seus pais? (E não disponíveis aqui, leia-se também materialmente, emocionalmente, por morte, ou seja pela razão que for - Porque sempre há uma razão para alguém não estar disponível para seu filho).
Não, os pais que ficaram indisponíveis não deixam de ser os pais. Isso é um fato da existência desta criança, e nunca mudará.
Além disso, os pais, seja em que condições tenham concebido, são responsáveis pelo PRIMEIRO, por aquilo que faz com que qualquer coisa seja possível depois. Sem que os pais concebessem este filho, nada mais seria possível depois.
Com a concepção, todo o resto passa a ser possível: que alguém assuma os cuidados pela criança, que a criança cresça e se desenvolva, etc.
O que vemos na Abordagem Sistêmico-Fenomenológica de Bert Hellinger, conhecida como Constelação Familiar, é que tudo o que aconteceu antes, nos constitui.
Significa que quem eu sou está constituído de todas as experiências, mesmo aquelas que foram vivenciadas como desagradáveis.
Também vemos que toda exclusão, produz uma obsessão. Já ouviu dizer que “tudo que você resiste, persiste?” Pois então, a exclusão dos pais biológicos, a negação de sua existência, produz consequências no presente.
No filme LION, o personagem principal Saroo, um indiano adotado por um casal australiano, vai em busca de suas raízes na Índia.
Saroo passa muito tempo sem se lembrar destas raízes. E de fato, frequentemente excluímos algo, não porque somos ruins, senão porque é algo que nos é doloroso. A exclusão é como uma estratégia de sobrevivência. No caso de Saroo, podemos dizer que a exclusão permitiu que ele se adaptasse a uma realidade completamente diferente que lhe permitiu não somente sobreviver, mas viver.
Mas toda estratégia é temporária e válida somente num determinado contexto.
No filme, acontece um encontro de Saroo com colegas universitários na Austrália. Há outro indiano entre eles. Saroo, neste jantar, vê um doce que ansiava comer quando criança na Índia, “jalebis”, e este momento dispara a memória de suas raízes. Desde este momento, não pôde mais ignorar o quão importante esta raiz era para ele.
Saroo se deprime e não consegue mais manter sua relação de casal. Aliás, frequentemente as relações de casal declinam quando um ou ambos estão por algum motivo retirados emocionalmente para seu próprio sistema familiar de origem. Ainda que de forma inconsciente, este é um motivo muito frequente das separações.
Mas voltando para a jornada de volta à Índia de Saroo, quando ele logra encontrar as respostas que procurava na Índia, pode retornar. Ele fala para a mãe australiana ao telefone que está voltando, pois “já não há mais pontas soltas”.
Quando temos que voltar a algo, ou repassar em nossa mente uma experiência passada? Quando há pontas soltas.
Ter pontas soltas significa que ainda há algo para ser compreendido. Algo que é importante a ponto de não sermos capazes de seguir adiante sem integrá-lo conosco.
Lion nos mostra uma história de adoção. E a adoção também pode se desenvolver de diferentes maneiras. E a postura dos pais adotantes tem profunda influência neste desenrolar.
No primeiro contato com Saroo, sua mãe australiana lhe diz:
“Tenho certeza que não foi fácil.
Um dia você me contará.
Eu sempre irei ouvir”.
O que ela está dizendo no fundo é, EU TE TOMO INTEIRO. E este inteiro contém tudo o que aconteceu antes de nosso encontro.
Uma adoção tem mais chances de ter sucesso, quando os pais que adotam tomam na criança tudo que pertence a ela antes, inclusive os pais biológicos.
Em algumas representações de Constelações Familiares, vemos que quando os pais que adotam são capazes de dizer aos pais biológicos: “Eu tomo conta dele por vocês com amor”, há uma profunda reconciliação para todos.
Então mãe é quem cria?
A resposta parece que é paradoxal: Sim e não.
Mãe é quem cria. Esta frase é verdadeira, desde que ela não invalide a mãe que deu a vida.
Então, mãe é TAMBÉM quem cria, mas não somente. ;)
Greice Machado
Consteladora Familiar Sistêmica treinada pelo IDESV desde 2012
Master en Intervención Social con Indivíduos, Familias Grupos pela Universidad Pública de Navarra - Espanha.
Atende Individualmente, casais e famílias. Realiza Palestras e Grupos de Estudo com o intuito de demonstrar que a Filosofia Sistêmica é acessível a todos e que CONSTELAR é um ato interno.
Comentários